sábado, 31 de julho de 2010

XX – HOROLÓGIO QUARTZ

(Ouço os ruídos do Eska Quartz. Sua agulha vermelha diz tic num segundo e tac às vésperas do outro. As pretas – são duas, uma maior do que a outra – vão anunciando o lento nascimento-e-morte de uma estrela.
Tempo, Tempo, Tempo! Irremediável Tempo!
Atravessa a Rua Velha, lentamente, uma liteira, madeira trabalhada, verniz, negros suando, pesada e grave.

O Tempo (perdoe-me Einstein) é um rei absoluto. Reina sobre tudo e sobre todos. Déspota esclarecido: permite amores e dores; nele e por ele e apesar dele nascem as flores, murcham as flores; faz fenecer sóis distantes, faz renascer universos. O Tempo é uma face de Deus.
Vejo o brilho azulado e cintilante de uma estrela que já não está lá. Seu brilho ilude o tempo e finge que é permanente. Marília brilha como essa estrela que já não está lá. Bebo o seu brilho, mulher de sonho que ilude o tempo. Mulher-estrela, luz azulada, brilha no espaço, e o espaço é verso, tempo sem tempo.
Na Rua Nova, leio a manchete em um jornal:

EXPLODE NO AR O ÔNIBUS ESPACIAL.

Apesar de tudo o rei consulta o seu cortejo de estrelas. Todas estão cintilando. Mesmo as que já não brilham mais. E o Eska Quartz insiste em tic num segundo e tac às vésperas do outro.

...Sobrevivo azuladamente ao meu tempo...)



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►XXI