Horológio
Tábua de Marés
Preamar # 14h48
RECOSTADO na mureta da Ponte Velha, estático, os olhos vivos fitando a flor d’água. Lá embaixo, o rio desliza: a água serena, a maré cheia.
Cingindo o seu antebraço, amarrada entre a palma da mão esquerda e o cotovelo, a corda central que sustém a rede circular. A armadilha, coniforme, penduleia, rente à sua perna. A água escorre pelas pequenas chumbeiras.
Atento, imóvel, arma o bote, recostado à ponte. A brisa sopra a maresia e ele espera, instintivo como uma fera. De repente, zás!
Arremessa a rede, flor aberta sobre a superfície das águas. A corda, áspide longilínea, escapa-lhe das mãos, serpeando no ar. A malha, enfim explode n’água. E submerge, rapidamente, cilada repentina. Some nas águas do rio, a flor, bela e maldita, a flor, bela e letal... Submerge, sob o peso dos grãos de chumbo na tralha inferior.
►alea índex
XLVII◄